As águas do Brasil sob risco de privatização
Por que o saneamento tornou-se um lucrativo negócio, inclusive para o rentismo. Como um projeto de lei, em tramitação no Senado, ameaça novamente as companhias públicas de água e esgoto — e pode aprofundar a crise sanitária
Publicado 16/06/2020 às 20:23 - Atualizado 16/06/2020 às 20:32
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Edson Aparecido da Silva em entrevista a Rôney Rodrigues, no Tibungo
A água como bem comum pode estar com os dias contados, no país onde ela é mais abundante. Tramita no Senado o projeto de lei 4162, de 2019, proposto pelo governo Bolsonaro, que pretende desmantelar o saneamento brasileiro, entregando-o para o setor privado. Nesta edição do Tibungo, conversamos com Edson Aparecido da Silva, secretário-executivo do ONDAS (Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento), que junto movimentos sociais e academia, acompanha intensamente o debate sobre o tema.
Esse projeto tem como cerne extinguir o subsídio cruzado, uma espécie de mecanismo democrático para partilhar o acesso às riquezas: assim, municípios com maior arrecadação contribuem para ações de saneamento naqueles mais pobres. Corre o risco desse mecanismo acabar, assim como de as companhias estaduais de água e esgoto serem desmontadas, ao se verem obrigadas a promover licitações para privatizar o serviço, já que o projeto prevê metas “duras” para o público e “mais brandas” para os operadores privados. Além disso, a probabilidade de financeirização da água é grande, já que empresas como a BRK Ambiental, a Iguá e a Aegea, controladas por fundos especulativos, controlam boa parte dos municípios que passaram a prestação do serviço para a iniciativa privada.
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Os dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, de 2015, apontam que apenas METADE dos brasileiros têm à coleta de esgoto e 83,3% são abastecidos de água. Se o sistema for entregue a empresas, a universalização do saneamento será um sonho cada vez mais distante. O Brasil iria na contramão mundial. Segundo estudo realizado pelo Instituto Transnacional, sediado na Holanda, de 2000 a 2017, mais de 800 municípios, em mais de 35 países, reestatizaram seus serviços. Até o Banco Mundial, que nos anos 90 defendia a privatização dos serviços públicos de água e esgoto, agora reconhece a importância do Estado na área.
O saneamento básico no Brasil teve avanços positivos e expressivos em vários de seus indicadores desde 2007, graças ao marco legal estabelecido pela Lei Nacional de Saneamento. Agora, esse processo pode ser bruscamente interrompido. Edson Aparecido da Silva destaca que municípios pobres que privatizaram o serviço de água e esgoto enfrentam graves crises hídricas e sanitárias – como Manaus, que não por acaso é uma das mais afetadas pela pandemia.
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