O Futuro não é a Tecnologia.
E a Ciência com isso?
Mauro Guimarães
Prof. Dr. UFRRJ
Somos a geração tecnológica, o progresso nos condiciona,
crescer mais, crescer sempre, é a meta de tudo e de todos. Para nós,
desenvolvimento é o resultado da evolução tecnológica, é a modernidade que nos
fascina. Com isso, se tem a profunda convicção que a tecnologia é o sentido da
vida e o desenvolvimento tecnológico, motor da economia, é o nosso futuro certo
e próspero e que temos como sinônimo de qualidade de vida. Se há um problema, a
tecnologia resolve. Uma crença que nos faz passivamente esperar o futuro
tecnológico para nos salvar.
Mas a Biologia deu o ar da sua graça e um microrganismo
parou no presente a tudo e a todos. Colocou a prova o futuro próspero da crença
tecnológica. Diante da ameaça do Coronavírus, hoje para nos protegermos, a
geração tecnológica conta com máscaras de pano, lavar as mãos com água e sabão
e pararmos de circular! Cai por terra o mito da modernidade tecnológica que a
tudo controla, domina e nos protege.
A tecnologia, de muitas contribuições sim, mas submissa às
necessidades da economia, afastou-se da preservação da vida como prioridade das
necessidades humanas. Economia tecnológica que domina e explora os recursos
naturais a exaustão. Porém a Biologia, Ciência da vida, demonstra a nossa
dependência de relações que nos integra do micro a algo bem maior. Temos a
expansão de um microrganismo letal a vida humana, que a tecnologia não domina,
não controla, mas que a tudo parou: economia, frenesi cotidiano, modernidade
prometida.
A pandemia que vivemos em isolamento nos dá a rara
oportunidade de parar e percebermos a vida que levamos. A modernidade em
expansão global, o pretenso desenvolvimento das forças produtivas em direção ao
mítico crescimento econômico infinito, que segue a lógica da economia que não
pode parar. Nessa insensata corrida, a interdependente saúde humana e
planetária não é o foco do desenvolvimento. Criamos e vivemos uma sociedade em
que o progresso humano é secundário em relação ao econômico e a tecnologia
colocada como refém. Parados e isolados, sem a caudalosa correnteza que nos
empurra e afoga nesse modo de vida alucinante, sufocados e inconscientes para
um progresso humanamente não desejado, mas economicamente criado, temos hoje a
oportunidade única em nossas histórias de vivenciar e participar na construção
de novos rumos para a humanidade.
Mas que sejamos
humanamente criativos em busca da consonância sustentável com a vida
planetária. Como estão sabiamente dizendo, não podemos voltar a normalidade,
pois a normalidade é o problema.
A opção é de ruptura com o velho e a construção do novo a
ser conquistado agora. Novas práticas comprometidas com a sustentabilidade
socioambiental e com o futuro do desenvolvimento humano das novas gerações,
nossos filhos e netos, é a grande meta. Negacionismo da Ciência agora, é a
barbárie.
Colocar a Ciência a favor do desenvolvimento humano é romper
com a prioridade ao econômico para o desenvolvimento futuro. É estabelecer como
política pública que o conhecimento esteja comprometido com às necessidades
humanas e ambientais em primeiro lugar. Que tenha na Ciência e em um dos seus
produtos, a Tecnologia, o apoio para levar o desenvolvimento humano para novos
patamares. Essa é uma opção política de profunda ruptura com o mundo que está
aí em colapso e de nos reorganizarmos como uma outra sociedade. Uma opção
marcada pela grande necessidade de superarmos graves crises. A pandemia é
apenas um ensaio de um desafio muito maior que nos circunda; a emergência
climática.
As Ciências, Humanas, da Natureza e Exatas, desde que não
submetidas ao poder do econômico, podem ser um importante instrumento para esse
desenvolvimento da humanidade na superação de seus grandes desafios. No Brasil,
mais de 90% da produção Científica é produzida nas Instituições de Pesquisas e
Universidades Públicas. A importância de serem públicas é que, por seu caráter
público, podem estar voltadas para o desenvolvimento do conhecimento
desatreladas da prioridade aos interesses econômicos, principalmente quando
esses são interesses meramente privados. A grave crise que vivemos na saúde,
com a perspectiva de colapso do sistema hospitalar, causado por políticas
neoliberais de abandono dos serviços públicos e redução da presença do Estado,
é um claro exemplo da importância de termos a Ciência voltada para o público,
mobilizada prioritariamente pelos interesses humanitários. Pois são essas
Universidades e Institutos de Pesquisas que estão, junto ao Serviço Único de
Saúde Pública (SUS), na linha de frente no combate ao Coronavírus no Brasil.
Tenho a esperança que essa pandemia, que tantos transtornos
está causando no nosso modo de vida, no cotidiano frenético da modernidade,
possa ser uma oportunidade profunda de despertar para a essencial mudança de
rumos e construção social de novas relações humanamente colaborativas e
solidárias. Transformações fundamentais para enfrentarmos um desafio muito
maior que aí está.
Como Professor e pesquisador de uma Universidade Pública,
acredito que, e milito para, que a Ciência se comprometa com a priorização do
desenvolvimento humano. Uma Ciência forte e valorizada pela sociedade pode
contribuir na conquista de um futuro, em que a realização das necessidades
humanas equilibradas em relações sustentáveis com a natureza, seja prioritária
na organização econômica de uma nova sociedade que teremos que reinventar
agora. O futuro será o que fizermos nesse grave presente, ele não está dado nem
pré-determinado, a oportunidade está colocada.
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