terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

carta: solicitação de audiência

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Brasil, 12 de fevereiro de 2019.


V. Exa. RICARDO SALLES
Ministro do Meio Ambiente
Governo Federal Brasileiro


Senhor Ministro,

O Brasil é um dos países que assegura constitucionalmente o direito de todos os cidadãos e cidadãs a um meio ambiente sadio e equilibrado, estabelecendo como responsabilidade de todos (Estado, empresas e Sociedade), o cuidado com sua preservação. A educação ambiental é um dos mecanismos para garantir esse direito, e também foi inscrita como direito de todos os brasileiros. Dessa forma, o Brasil se destaca internacionalmente como um país que busca promover a gestão ambiental de forma integral e integrada às demais dinâmicas sociais, econômicas e culturais.  

Robusta e abrangente para dar conta de um país de dimensões continentais, a Política Nacional de Educação Ambiental possui institucionalidades político-administrativas complexas a ponto de articular transversalmente dois ministérios – Meio Ambiente e Educação – em torno da figura jurídica do Órgão Gestor, pautados por princípios, diretrizes e objetivos comuns, oriundos das recomendações de eventos acadêmicos, acordos e tratados internacionais que formataram as grandes orientações para a Educação Ambiental. Para tal, a Política Nacional de Educação Ambiental demandou conjunturalmente a elaboração de um Programa Nacional de Educação Ambiental; e estruturalmente, a criação de um sistema articulado transversal e democrático, de gestão, coordenação, supervisão, financiamento, monitoramento, avaliação, produção de pesquisa e materiais didáticos e meios de interlocução democrática. Destacando-se nesse contexto, a existência de uma instância político-administrativa federal denominada Comitê Assessor e outra, no âmbito das Unidades Federativas, as Comissões Interinstitucionais de Educação Ambiental, que na lógica do pacto federativo, garantem a participação e o controle social sobre a gestão pública da Política Nacional de Educação Ambiental.

Amparada por uma rica e sólida produção intelectual sobre a epistemologia, os conceitos, as metodologias, as modalidades e diversas outras características pedagógicas, elaborada de forma sinérgica e articulada entre grupos de pesquisa em instituições universitárias e redes de organização coletiva dos educadores e educadoras ambientais, a Política Nacional de Educação Ambiental está presente no território e atinge enorme capilaridade tanto nos estabelecimentos formais de ensino como, nos moldes da educação popular, em espaços não formais de educação.

A Educação Ambiental fermenta e viceja em praticamente todas as escolas, universidades, unidades de conservação, empresas, igrejas, sindicatos, comunidades, organizações não governamentais, licenciamento ambiental, programas e políticas ambientais setoriais e outros espaços coletivos; com destaque para uma das principais características do pioneirismo brasileiro para com a Educação Ambiental, que foi ter transcendido o reducionismo de uma educação conservacionista abrindo-se ao diálogo com as lógicas da educação popular, para o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e competências do educando capaz de interagir de forma ampla e coerente com o exercício da cidadania ambiental por meio da participação social no enfrentamento dos problemas e conflitos ambientais.

Perplexos por constatar que o decreto de reestruturação político-administrativa do governo federal extinguiu o Departamento de Educação Ambiental do Ministério do Meio Ambiente e a Coordenação Geral de Educação Ambiental do Ministério da Educação, que o conjunto das organizações, entidades e grupos de Educação Ambiental de todas as regiões brasileiras e de todas correntes e tendências pedagógicas, elaboraram, ainda em janeiro de 2019, diversos manifestos encaminhados a esses dois ministérios, tendo em vista que esse novo arranjo institucional inviabiliza a condução da Política Nacional de Educação Ambiental com a centralidade institucional que ela demanda.

No caso do Ministério do Meio Ambiente, o rebaixamento institucional e a subordinação a uma secretaria que trata de uma pauta particular da vasta temática ambiental é uma ameaça à continuidade da Política Nacional de Educação Ambiental, além de ferir a letra da legislação, regida pela lei federal 9795/99 e regulamentada pelo decreto 4281/02. No contexto de enfraquecimento institucional, de redução de equipe técnica qualificada, de cortes de verbas e extinção de institucionalidades, certamente o Governo Federal não terá capacidade nem condições de seguir a trajetória de sucesso que o Brasil conquistou com a efetiva condução da Política Nacional de Educação Ambiental.

A sociedade devidamente esclarecida sobre as causas e consequências da crise ambiental e das mudanças climáticas é condição imperativa para que as soluções contra o colapso ambiental estejam ao nosso alcance, e essa premissa é tarefa primordial da Educação Ambiental. A redução do Estado não pode ocorrer em prejuízo da garantia da construção social da transição ecológica e da instauração da cultura da sustentabilidade, conforme já elucidados detalhadamente em notas, manifestos e cartas anteriormente já entregues e protocolados neste Ministério, que ainda aguardam vossa resposta.

É nesse cenário que nós, do OBSERVARE – Observatório de Educação Ambiental; o GT 22 de EA da ANPED; a Rede Brasileira de Educação Ambiental (REBEA) e as 50 Redes Temáticas, Territoriais e de Juventude; as Comissões Estaduais Interinstitucionais de Educação Ambiental; a Frente Ampla Democrática Socioambiental (FADS); o permanente diálogo com as bases da comunidade brasileira de educadores e educadoras ambientais e, também, considerando a Nota Técnica de membros do Comitê Assessor do Órgão Gestor da PNEA; vimos solicitar uma audiência para debater as mudanças propostas e esclarecer os rumos da Política e do Programa Nacional de Educação Ambiental previstos para o novo governo.


No aguardo de vossa resposta positiva, saudamos com PAULO FREIRE & CHICO MENDES, que ainda vivem na memória do povo brasileiro, eternizados pelas majestosas contribuições à nossa cidadania.




   CIEA 

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